terça-feira, julho 29, 2008

O Homem que mordeu o cão - Nuno Markl

" Em conversa com o irmão mais novo de um amigo, cheguei a uma triste conclusão.
A juventude de hoje, na faixa que vai até aos 20 anos, está perdida. E está perdida porque não conhece os grandes valores que orientaram os que hoje rondam os trinta.
O grande choque, entre outros nessa conversa, foi quando lhe falei no Tom Sawyer.
"Quem? " , perguntou ele. Quem?!
Ele não sabe quem é o Tom Sawyer! Meu Deus... Como é que ele consegue viver com ele mesmo?
A própria música: " Tu que andas sempre descalço, Tom Sawyer, junto ao rio a passear, Tom Sawyer, mil amigos deixarás, aqui e além... " era para ele como o hino senegalês cantado em mandarim.
Claro que depois dessa surpresa, ocorreu-me que provavelmente ele não conhece outros ícones da juventude de outrora.
O D'Artacão, esse herói canídeo, que estava apaixonado por uma caniche;
Sebastien et le Soleil, combatendo os terríveis Olmecs;
Galáctica, que acalentava os sonhos dos jovens, com as suas naves triangulares;
O Automan, com o seu Lamborghini que dava curvas a noventa graus;
O mítico Homem da Atlântida, com o Patrick Duffy e as suas membranas no meio dos dedos;
A Super-Mulher, heroína que nos prendia à televisão só para a ver mudar de roupa (era às voltas, lembram-se?);
O Barco do Amor, que apesar de agora reposto na Sic Radical, não é a mesma coisa. Naquela altura era actual..
E para acabar a lista, a mais clássica de todas as séries, e que marcou mais gente numa só geração: O Verão Azul.
Ora bem, quem não conhece o Verão Azul merece morrer. Quem não chorou com a morte do velho Shanquete, não merece o ar que respira.
Quem, meu Deus, não sabe assobiar a música do genérico, não anda cá a fazer nada.
Depois há toda uma série de situações pelas quais estes jovens não passaram, o que os torna fracos.
Ele nunca subiu a uma árvore! E pior, nunca caiu de uma. É um mole.
Ele não viveu a sua infância a sonhar que um dia ia ser duplo de cinema.
Ele não se transformava num super-herói quando brincava com os amigos.
Ele não fazia guerras de cartuchos, com os canudos que roubávamos nas obras e que depois personalizávamos. Aliás, para ele é inconcebível que se vá a uma obra.
Ele nunca roubou chocolates no Pingo-Doce.
O Bate-pé para ele é marcar o ritmo de uma canção.
Confesso, senti-me velho...
Esta juventude de hoje está a crescer à frente de um computador.
Tudo bem,por mim estão na boa, mas é que se houver uma situação de perigo real, em que tenham de fugir de algum sítio ou de alguma catástrofe, eles vão ficar à toa, à procura do comando da Playstation e a gritar pela Lara Croft.
Óbvio, nunca caíram quando eram mais novos. Nunca fizeram feridas, nunca andaram a fazer corridas de bicicleta uns contra os outros.
Hoje, se um miúdo cai, está pelo menos dois dias no hospital, a levar pontos e a fazer exames a possíveis infecções, e depois está dois meses em casa a fazer tratamento a uma doença que lhe descobriram por ter caído.
Doenças com nomes tipo "Moleculum infanticus", que não existiam antigamente.
No meu tempo, se um gajo dava um malho (muitas vezes chamado de "terno" nem via se havia sangue, e se houvesse, não era nada que um bocado de terra espalhada por cima não estancasse.
Eu hoje já nem vejo as mães virem à rua buscar os putos pelas orelhas, porque eles estavam a jogar à bola com os ténis novos.
Um gajo na altura aprendia a viver com o perigo.
Havia uma hipótese real de se entrar na droga, de se engravidar uma miúda com 14 anos, de apanharmos tétano num prego enferrujado, de se ser raptado quando se apanhava boleia para ir para a praia.
E sabíamos viver com isso.
Não estamos cá? Não somos até a geração que possivelmente atinge objectivos maiores com menos idade?
E ainda nos chamavam geração "rasca"... Nós éramos mais a geração "à isso sim.
Sempre à rasca de dinheiro, sempre à rasca para passar de ano, sempre à rasca para entrar na universidade, sempre à rasca a ver se a namorada estava grávida, sempre à rasca para tirar a carta, para o pai emprestar o carro.
Agora não falta nada aos putos. Eu, para ter um mísero Spectrum 48K, tive que pedir à família toda para se juntar e para servir de prenda de anos e Natal, tudo junto.
Hoje, ele é Playstation, PC, telemóvel, portátil, Gameboy, tudo.
Claro, pede-se a um chavalo de 14 anos para dar uma volta de bicicleta e ele pergunta onde é que se mete a moeda, ou quantos bytes de RAM tem aquela versão da bicicleta.
Com tanta protecção que se quis dar à juventude de hoje, só se conseguiu que 8 em cada dez putos sejam cromos.
Antes, só havia um cromo por turma. Era o totó de óculos, que levava porrada de todos, que não podia jogar à bola e que não tinha namoradas.
É certo que depois veio a ser líder de algum partido, ou gerente de alguma empresa de computadores, mas não curtiu nada.
Hoje, se um puto é normal, ou seja, não tem óculos, nem aparelho nos dentes, as miúdas andam atrás dele, anda de bicicleta e fica na rua até às dez da noite, os outros são proibidos de se dar com ele... agora. "

sexta-feira, julho 25, 2008

Falemos de Psiquiatria...

E porque as Perturbações da Personalidade passam na maior parte das vezes despercebidas por serem encaradas como "traços" da personalidade e não como algo patológico, anda muita boa gente por aí que preenche quase todos os requisitos de algumas delas. Deixo-vos a Perturbação da Personalidade Histriónica:


" Esta personalidade é duma extrema emotividade e os indivíduos que a possuem necessitam ser o centro das atenções, adoptando qualquer meio para atingir os seus fins, como comportamentos provocatórios de sedução sexual, por vezes inadequados. Normalmente utilizam a aparência física que é cuidadosamente tratada conforme as pessoas e as situações, para tornar-se exuberantemente chamativa para mais facilmente atrair sobre si as atenções. Exercitou ao longo do tempo discursos convincentes que impressionam as pessoas a quem se dirigem, e muda de tema para tema conforme a pessoa, sempre convincentemente declamado, mesmo na maior das mentiras. Cada pessoa a quem se dirige é sempre uma mudança radical de postura e discurso, numa forma exageradamente emotiva e atraente.
Na verdade é um soberbo actor teatral no palco da Vida! No entanto é duma fraca personalidade, facilmente influenciável, especialmente pelos que têm características semelhantes, e deixa-se também influenciar muito facilmente pelas circunstâncias que lhe convém. São os que baralham e enganam facilmente os médicos, ou psiquiatras, saindo vitoriosos do seu tão malabarístico e emotivo poder de convencer.
A personalidade histriónica é mais característica nas mulheres. Facilmente representam um grande amor mesmo que nada sintam. Os namorados são facilmente atraídos, e neste campo a faceta teatral pode ir do deslumbramento do mais feliz enamoramento, aos tremendos conflitos que mascara com desesperos dignos da mais profunda compaixão. O histriónico tem dificuldade, senão quase impossibilidade de lidar com a sua própria identidade, porque como disse ele confunde todos os que quere confundir, sem se aperceber que está a confundir-se cada vez mais a ele próprio.
É muito difícil diagnosticar este distúrbio de personalidade, pela sua fortíssima arte teatral de enganar num parecer consoante as circunstâncias e as conveniências. Perderam ao longo da caminhada a consciência do Ser! Parecer ... numa constante e firme vontade de atrair as atenções, em atitudes sempre emotivas e convincentes... Será que são mais felizes os possuidores da personalidade histriónica?!..."


Então conhecem alguém assim?

quinta-feira, julho 24, 2008

Fragilidade

Estou de férias... Mais um ano lectivo terminado, um ano muito mais enriquecedor a nivel intelectual e a nível pessoal, mais experiências, maior consciência da profissão que se avizinha... Ensinam-me diariamente como diagnosticar, como tratar, como avaliar o prognóstico. Há doenças fáceis de diagnosticar, outras que exigem maior perspicácia; há tratamentos eficientes, outros nem tanto e outros que nem sequer foram ainda descobertos; quanto ao prognóstico aprendemos quais as doenças com boa evolução e outras pelas quais não poderemos fazer muito para melhorar... Tudo bem até aqui, parece que podemos resumir mais ou menos assim aquilo que realmente interessa saber! No entanto sinto falta de um outro conhecimento: o saber lidar com o sofrimento, com a dor psicológica, com a morte... Eu sei que esse vai ser a vida a dar-me mas preferia que também viesse nuns quantos paragrafos ou esquemas em que me demoraria apenas alguns minutos.

O que fazer quando nem a esperança serve? O que dizer quando o fim cada vez se torna mais claro? Como aguentar as lágrimas que teimam em cair...
Não sei ainda as respostas a estas perguntas, não sei se saberei algum dia... Tenho vontade de voltar àquela idade em que os nossos pais eram mestres em disfarçar os acontecimentos maus e em que nós ainda não suspeitávamos que poderia haver muito mais que os colegas da escola e o baú cheio de brinquedos. Quero ser criança mas já sou adulta! Não é a idade que me diz mas sim a vida que me empurra, me obriga a crescer e me mostra que o tempo da redoma de vidro já lá vai e que a independencia adquirida, que às vezes sabe tão bem, também serve para agir. Não é mais o momento para ser protegida, mas sim de dar o passo em frente, o momento de ser eu a proteger e a cuidar.
A vida é frágil, e quando está perto do fim, mais frágil fica e tem que ser cautelosa mas sempre determinada, a forma como a deveremos segurar, para que entre o calor das nossas mãos esta se aguente mais um tempo, aquele tempo que julgávamos eterno e que agora parece depender de nós...